:: Raridades ::
quarta-feira, abril 04, 2007

Não se trata de negar o racismo no Brasil ou na UnB. Ele existe, e é tão cruel quanto silencioso. Está presente no dia-a-dia, nas gavetas mais recônditas dos corações e mentes de colegas, professores e funcionários. Fica lá, se escondendo, covarde que é. Mas ele fala alto, manifesta-se em pequenas e grandes coisas, é influente nos juízos e decisões cotidianas. Difícil será o caminho para que um dia tenhamos uma sociedade que respeite minimamente o direito que todos temos de sermos o que somos: diferentes.

Mas convém não misturar alhos e bugalhos se quisermos enfretar esse problema de forma eficaz. Racismo e xenofobia são males próximos, mas definitivamente longe de serem a mesma coisa. Em meus anos de graduação e mestrado (sete, para ser mais preciso) tive a oportunidade de conviver intensamente com colegas moradores do CEU. E sempre tive notícia de problemas sérios de convivência entre os moradores, boletins de ocorrência por roubo, discussões, brigas, em muito causados pelo abandono das instâncias decisoras da universidade com um espaço tão importante na vida de qualquer campus.

Sabemos também que nossos colegas de países africanos têm costumes bem diferentes dos nossos, e também entre si - arrisco-me a dizer que tão diferentes que faz qualquer generalização como "africano" no mínimo inapropriada. Cabo-verdianos, angolanos e nigerianos têm a cor da pele em comum, mas podem ser tão diferentes como nós e os argentinos. Conviver com a diversidade gera riqueza de experiências, mas também tensões. E se lidar com a diferença em uma relação a dois já é complicadíssimo, no coletivo as coisas tornam-se um constante exercício de caminhar sobre ovos. Junte-se o estado de abandono completo do CEU, e temos um barril de pólvora.

A rádio-corredor da UnB tem ruídos, mas funciona muito bem. E com a informação que temos, sabemos que as tensões com os alunos africanos se dão pelo fato de serem estrangeiros e de um estrato social mais pobre. As reclamações mais comuns que já ouvi diziam respeito ao horário das festas e outros encontros, ao asseio nas instalações, ao barulho, à recorrência de atividades "ilícitas". Pergunto-me: seria diferente se fossem com estudantes russos, indianos ou chineses? Creio que não. Mais uma vez repito: não se trata de se negar o racismo na UnB ou no Brasil. Mas deste humilde ponto-de-vista, não há sistemática racista com relação a esse caso. Há sim xenofobia. E ela deve ser combatida com igual seriedade.

Mas o que mais me impressiona é a agilidade oportunista com que grupos sectários de nossa universidade se apropriaram do ocorrido como bandeira de luta. Chamo-os de sectários porque têm por finalidade dividir, não de integrar; de aprofundar as diferenças, e não a de estimular sua aceitação. Acho de uma ironia sarcástica a existência desses grupos em um Campus que leva o nome de Darcy Ribeiro. Um tempo atrás deparei-me com um "Espaço de Convivência Negra", corrijam-me se eu estiver errado. Não era um "espaço para a diversidade cultural" ou qualquer coisa do tipo: o título estava bastante claro. Perguntei-me se eu, nordestino e semita, seria bem-vindo. Preferi não pagar pra ver.

Não venceremos a batalha por corações e mentes se insistirmos em um modelo de confrontação, aprovando cotas e demarcando espaços como trincheiras. A palavra convence, mas o exemplo arrasta. Só venceremos o racismo se pregarmos e agirmos com tolerância, em pequenas vitórias, no dia-a-dia. Aos sectários, recomendo a leitura de Gandhi. Esse sim conseguiu praticar o que pregava.


"Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha
"

RAFA @ 14:53 tic-tac-tic-tac